Ministério da Saúde aponta “estabilidade epidemiológica”, mas surto deixou 22 mortos e quase 900 notificações no país
8 de dezembro de 2025 às 16:48
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Política
O Ministério da Saúde decidiu fechar a sala de situação criada para acompanhar o surto de intoxicações por metanol no país. A portaria que encerra o monitoramento ampliado foi publicada nesta segunda-feira (8) no Diário Oficial da União, pouco mais de dois meses após a estrutura emergencial ser montada às pressas, em meio ao avanço de casos e mortes.
De acordo com a pasta, o último caso confirmado foi registrado em 26 de novembro de 2025. Os primeiros sintomas desse paciente surgiram três dias antes, no dia 23. De lá para cá, o governo sustenta que houve uma redução expressiva de novos registros e óbitos. Com isso, avalia que o país entrou em um cenário de “estabilidade epidemiológica”, expressão que, no vocabulário oficial, costuma funcionar como atestado de missão cumprida.
O ministério afirma que todos os estados contam atualmente com estoques garantidos de antídotos e maior capacidade de diagnóstico. Com o encerramento da sala de situação, a assistência volta ao fluxo rotineiro da vigilância de intoxicações exógenas, por meio do Sistema de Informação de Agravos de Notificação, o Sinan. Em outras palavras, o problema deixa de ser tratado como crise nacional e volta a ocupar a prateleira permanente das emergências silenciosas.
A sala de situação foi instalada no dia 1º de outubro, poucos dias após os primeiros alertas sobre um possível surto de intoxicação por metanol. O aviso inicial partiu em 26 de setembro do Sistema de Alerta Rápido da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos, ligada ao Ministério da Justiça. A partir dali, a engrenagem federal foi acionada com velocidade incomum para os padrões da burocracia sanitária.
Ao longo do período, a sala reuniu representantes da Anvisa, da Fiocruz, da Ebserh, do Conselho Nacional de Saúde e da Organização Pan-Americana da Saúde, além de técnicos dos ministérios da Agricultura e da Justiça, encarregados de ações de controle, fiscalização e investigação. O surto escancarou um velho problema que atravessa diferentes áreas do Estado: a circulação de bebidas adulteradas e a dificuldade histórica de impedir que cheguem ao consumo.
Durante o monitoramento ampliado, o Ministério da Saúde distribuiu aos estados 1.500 ampolas de fomepizol e 4.806 unidades de etanol, ambos usados como antídotos contra a intoxicação por metanol. As remessas priorizaram regiões com maior incidência de casos e circulação comprovada de bebidas contaminadas. Além disso, foi mantido um estoque estratégico de 2,6 mil ampolas para resposta rápida a novos episódios.
Entre 26 de setembro e 5 de dezembro de 2025, foram registradas 890 notificações de suspeitas de intoxicação por metanol no país. Desse total, 73 casos foram confirmados. Outros 29 permanecem sob investigação e 788 acabaram descartados após análise laboratorial.
O mapa da crise teve como epicentro o estado de São Paulo, com 578 notificações e 50 confirmações. Pernambuco aparece em seguida, com 109 notificações e oito casos confirmados. Paraná e Mato Grosso registraram seis casos cada. A Bahia teve dois casos confirmados, e o Rio Grande do Sul, um.
Ao todo, 22 mortes por intoxicação por metanol foram oficialmente confirmadas no país. Dez ocorreram em São Paulo, cinco em Pernambuco, três no Paraná, três em Mato Grosso e uma na Bahia. Outros nove óbitos ainda seguem em investigação, sendo cinco em São Paulo, três em Pernambuco e um em Alagoas. Mais de 20 notificações de mortes foram descartadas após exames.
O encerramento da sala de situação simboliza, para o governo, o fim de uma emergência sanitária pontual. Mas os números deixam uma lembrança incômoda. Em pouco mais de dois meses, uma substância proibida transformou garrafas em armas químicas improvisadas, atravessou fronteiras estaduais e expôs, mais uma vez, a fragilidade da fiscalização sobre um mercado clandestino que insiste em sobreviver entre a informalidade e a omissão.

Domingos Ketelbey
É repórter, colunista e apresentador. Conecta os bastidores do poder, cultura e cotidiano na cobertura jornalística
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