Roberto Ramalho, ao lado da mãe, Helenilda Maria: agora devidamente registrado (Foto: Gustavo Burns/DPE)

Roberto Ramalho, ao lado da mãe, Helenilda Maria: agora devidamente registrado (Foto: Gustavo Burns/DPE)

Roberto Ramalho, ao lado da mãe, Helenilda Maria: agora devidamente registrado (Foto: Gustavo Burns/DPE)

Roberto Ramalho, ao lado da mãe, Helenilda Maria: agora devidamente registrado (Foto: Gustavo Burns/DPE)

O filho que viveu 46 anos sem mãe no papel

Um erro do cartório em tempos de tabu do divórcio apagou Helenilda do registro de nascimento do próprio filho

29 de setembro de 2025 às 17:23

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Sociedade

Durante 46 anos, Roberto da Silva Alves Ramalho conviveu com um vazio oficial que nunca existiu na vida real. Em sua certidão de nascimento, o espaço destinado ao nome da mãe era preenchido por estrelas, como se Helenilda Maria da Conceição Silva fosse um detalhe em aberto, uma personagem que não tivesse existido. No mundo dos afetos, porém, ela sempre esteve presente.

A ausência nos documentos se transformou em constrangimento cotidiano. Ao longo da vida, Roberto ouviu perguntas atravessadas, encarou olhares de desconfiança e chegou a duvidar da legitimidade dos papéis que o identificavam. “Sempre perguntavam se eu não tinha mãe”, relembra.

O equívoco não era dele, mas do cartório que se recusou a registrar a maternidade em 1979, sob a justificativa de que Helenilda ainda constava como casada no papel com outro homem. A recém-aprovada Lei do Divórcio não havia derrubado, de imediato, os preconceitos que resistiam à modernização da família brasileira.

Quase meio século depois, mãe e filho foram juntos ao Dia D do programa Meu Pai Tem Nome, em Luziânia, para reparar a injustiça burocrática. Ali, diante da Defensoria Pública, não houve necessidade de exames de DNA nem de provas adicionais: o vínculo estava à vista, registrado nos anos de convivência, no afeto inquestionável e na vontade dos dois.

Um Termo de Entendimento foi assinado e seguiu para homologação judicial. Finalmente, as estrelas que ocupavam o espaço de Helenilda na certidão de nascimento de Roberto darão lugar ao nome que sempre deveria estar ali.

A defensora pública Maria Eduarda Serejo explica que, em tese, a ausência do nome materno não inviabilizava direitos. Mas na prática, gerava desconfiança e poderia trazer dificuldades em questões sucessórias ou previdenciárias. “É uma situação atípica. As pessoas achavam estranho. Isso poderia até impedir o direito à herança”, observou.

Helenilda, agora oficialmente reconhecida como mãe no papel, se emocionou ao agradecer a Defensoria. “Eu o carreguei por nove meses. Sempre disse: meu filho tem pai e tem mãe. Eu amo meu filho e digo isso com o maior prazer.” Ao fim, venceu o que nunca deveria ter sido questionado: o direito de um filho de carregar no documento o nome de sua mãe.



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Domingos Ketelbey

É repórter, colunista e apresentador. Conecta os bastidores do poder, cultura e cotidiano na cobertura jornalística

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Foto: Leo Iran