"Sem Bolsonaro, direita não tem nome capaz de unificá-la", avalia mestre em História Política
Professor aponta que base governista terá dificuldades crescentes, mas fragmentação da oposição abre margem para Lula”
24 de agosto de 2025 às 15:44
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Política
O bolsonarismo vai chegar em 2026 dividido entre a força das ruas e a fragilidade institucional. Para o professor de História Cristian de Paula Júnior, doutorando em História Política do Brasil pela UFG, a ausência do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL) no Congresso Nacional enfraquece a articulação do grupo no parlamento, ao mesmo tempo em que o deputado busca respaldo internacional, sobretudo junto a aliados de Donald Trump, para pressionar o Judiciário brasileiro. “O grande objetivo é conquistar anistia para Jair Bolsonaro”, sintetiza em entrevista exclusiva ao blog Domingos Ketelbey.
Na avaliação do historiador, a estratégia do clã está centrada menos em nomes alternativos e mais na tentativa de garantir condições para que o ex-presidente participe das eleições. Sem Bolsonaro na disputa, destaca, a direita tende a fragmentar-se ainda mais. “O bolsonarismo só se mantém competitivo se Jair for candidato. Preso, mesmo em regime domiciliar, perde a possibilidade de unificar a direita.”
No Congresso, a oposição ao governo Lula tem se mostrado mais radicalizada desde a prisão de Bolsonaro, com protestos e obstruções. Ainda assim, conquistou espaços estratégicos, como a CPMI do INSS. Para Cristian de Paula, a base governista deve enfrentar dificuldades crescentes até 2026, mas a fragmentação entre bolsonaristas e o Centrão abre margem para que o Planalto consiga construir sua própria narrativa e resistir ao desgaste.
O professor também vê na pré-candidatura de Ronaldo Caiado um ponto de tensão na direita. Segundo ele, o governador de Goiás tenta se equilibrar entre a imagem de conservador moderado e o discurso mais radical contra Lula. “A força de Caiado está em representar um eleitorado cansado da polarização, mas sua tentativa de se vender como um ‘Bolsonaro atualizado’ tende a fracassar”, avalia. Sobre Lula, Cristian aponta que, apesar da estagnação nas pesquisas, o presidente mantém competitividade graças ao histórico político e ao posicionamento nacionalista diante do tarifaço imposto pelos Estados Unidos.
LEIA A ENTREVISTA COMPLETA QUE O MESTRE E DOUTORANDO EM HISTÓRIA POLÍTICA, CRISTIAN DE PAULA JÚNIOR CONCEDEU AO BLOG DOMINGOS KETELBEY:
Domingos Ketelbey: Quase um ano das eleições, como o bolsonarismo deve chegar em 2026, haja vista Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos e Jair Bolsonaro em prisão domiciliar?
Cristian de Paula Júnior: O bolsonarismo segue dividido. Há um bolsonarismo das ruas, que ainda mobiliza manifestações, e o bolsonarismo institucional, dentro do Congresso, que perdeu força sem Eduardo Bolsonaro. A prioridade é clara: conquistar anistia para Jair Bolsonaro, porque sem ele candidato a direita se fragmenta e perde competitividade.
Domingos Ketelbey: Eduardo Bolsonaro deixou o Congresso para viver nos Estados Unidos. Qual é o objetivo dessa mudança?
Cristian de Paula Júnior: O objetivo declarado é atuar politicamente em defesa do pai. Ele busca apoio de aliados do governo Trump para pressionar o Judiciário brasileiro. Isso enfraquece o bolsonarismo no parlamento e abre até um vácuo de liderança dentro do PL.
Domingos Ketelbey: Ao mesmo tempo, ele tem participado de eventos internacionais. O que isso representa?
Cristian de Paula Júnior: Ele participou, por exemplo, da Cúpula Conservadora de Miami, onde defendeu as tarifas contra o Brasil e chegou a reivindicar para si esse protagonismo. Tenta se projetar como porta-voz internacional do bolsonarismo, mas as mensagens reveladas pela Polícia Federal mostram tensões internas entre ele e o próprio Jair Bolsonaro.
Domingos Ketelbey: Então a grande aposta para 2026 é a anistia?
Cristian de Paula Júnior: Sim. O clã Bolsonaro tenta desesperadamente a anistia para Jair Bolsonaro. Sem isso, não há um nome capaz de unificar a direita. Tarcísio, Zema e Caiado não têm consenso no campo bolsonarista.
Domingos Ketelbey: No Congresso, a oposição começou o ano com protestos radicais. O que isso revela?
Cristian de Paula Júnior: Mostra uma oposição mais agressiva, que chegou a obstruir fisicamente o plenário exigindo anistia aos envolvidos em 8 de janeiro. É curioso porque defendem hoje o fim do foro privilegiado, algo que o próprio bolsonarismo rejeitava quando estava no poder.
Domingos Ketelbey: Apesar disso, eles conquistaram espaços estratégicos, como a CPMI do INSS. Qual é o impacto disso?
Cristian de Paula Júnior: Mesmo divididos, conseguiram vitórias pontuais importantes. Essa CPMI será usada para colar a imagem de que os problemas do INSS são responsabilidade do governo Lula, embora sejam históricos de gestões anteriores.
Domingos Ketelbey: E como fica a base governista diante desse cenário?
Cristian de Paula Júnior: Terá dificuldades crescentes até 2026, mas não é um quadro sem saída. A fragmentação entre bolsonaristas e Centrão abre espaço para que o governo articule sua narrativa e busque se fortalecer.
Domingos Ketelbey: O governador Ronaldo Caiado tenta se projetar como pré-candidato a presidente. O que tem obtido até agora?
Cristian de Paula Júnior: Ele ampliou o reconhecimento nacional e tenta se firmar como oposição ferrenha ao governo Lula. Mas ainda não conseguiu dialogar com o bolsonarismo. Sua imagem é de conservador moderado, e é aí que está sua força. Ao tentar se apresentar como uma espécie de “Bolsonaro atualizado”, corre o risco de perder identidade.
Domingos Ketelbey: Pesquisas recentes mostraram um respiro para Lula diante do tarifaço de Trump. Isso muda o cenário?
Cristian de Paula Júnior: Deu um fôlego, mas não reverteu totalmente a estagnação. A aprovação segue patinando, embora Lula lidere em praticamente todos os cenários de segundo turno.
Domingos Ketelbey: Então o presidente continua competitivo?
Cristian de Paula Júnior: Sim. Ele construiu uma história que o coloca como protagonista em qualquer disputa. A defesa nacionalista diante do tarifaço reforça esse papel. Mantém vantagem especialmente contra adversários menos extremistas, como Caiado ou Zema.
Domingos Ketelbey
É repórter, colunista e apresentador. Conecta os bastidores do poder, cultura e cotidiano na cobertura jornalística
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